segunda-feira, 8 de junho de 2015

Engenharia Química Porn

“A maioria dos professores de Engenharia Química nunca projetou um processo real na indústria.”

“A ideia de que Engenharia Química é apenas ciência e matemática aplicadas é comum entre eles (professores), mas esta é uma ideia apenas daqueles que nunca trabalharam na prática ou nunca refletiram sobre ela.”

 “Todos os profissionais sabem que muito do que eles aprenderam na universidade não serve para nada na prática, e muito do que valeria a pena ser aprendido não foi ensinado.”

     Estas frases poderiam facilmente ser atribuídas a um estudante do 8º período de Engenharia Química. Entretanto, seu autor, na realidade, nem brasileiro é. Trata-se de Seán Moran, Engenheiro Químico com mais de 20 anos de experiência em design de processos e Professor da University of Nottingham. O professor Moran, em texto recente que pode ser lido na íntegra aqui, faz uma crítica ao que ele denomina de Process Porn.

     Para explicar este termo estranho ele faz uma analogia com a situação pela qual a física passa atualmente. Alguns físicos, em suas pesquisas, constroem modelos matemáticos bastante complexos para os quais passam muitos anos estudando soluções - também matemáticas. O que ocorre, segundo Moran, é uma fascinação pela matemática tamanha que muitas dessas pesquisas, apesar de matematicamente complexas, não possuem nenhuma base prática. Na língua inglesa, a palavra “porn” significa um desejo excessivo por uma questão específica. Neste caso dos físicos, por exemplo, o objeto deste desejo seria a matemática.

     Na área da Engenharia Química, segundo o professor, temos uma academia cada vez mais preenchida por cientistas que demonstram pouco interesse pela prática da Engenharia. Estes professores e professoras, em suas pesquisas, desenvolvem modelos matemáticos e modelos computacionais que, na teoria, parecem plausíveis, o que lhes daria segurança de que isso poderá ser aplicado na prática. Alguns desses professores, segundo Moran, até mesmo criam regras heurísticas baseadas nestes modelos cuja funcionalidade no mundo real não é comprovada. Isto, no caso de design de processos, pode ser chamado de Process Porn.

     Para o professor, a “ciência” Engenharia é a aplicação de princípios científicos para se estudar as questões de Engenharia e não uma aplicação de cálculos por si só. O maior exemplo disso, segundo ele, é a máquina a vapor que, em um primeiro momento, surgiu sem que houvesse uma teoria por trás de seu funcionamento e foi a partir deste equipamento que nasceu a termodinâmica.

“A ciência deve mais à máquina a vapor do que a máquina a vapor deve à ciência.” 
J. Henderson

     Segundo Moran, a sequência de design de um processo adotada por muitas escolas de Engenharia Química se resume nos seguintes pontos:

    1. Procurar experimentos que, na escala de bancada, forneçam processos químicos plausíveis;

    2. Utilizar estas técnicas não comprovadas para um exercício de custos em que serão avaliados apenas os preços das matérias-primas e do produto;

    3. Se o produto vende mais que a matéria-prima, assuma que o processo é econômico;

    4. Cria-se um modelo computacional em um simulador;

    5. Otimiza-se o processo para que os resultados convirjam (geralmente isto é feito utilizando-se reciclos);

    6. Aplica-se uma análise pinch seguindo as metodologias definidas;

    7. Elabora-se um relatório em poucas palavras descrevendo as etapas do design.


     Na avaliação de Moran sobre este procedimento, em nenhum momento se pensa sobre a efetividade do modelo no qual a simulação se baseia para o processo específico do aluno. Além disso, nenhuma consideração de scale up dos processos de bancada/piloto é feita, sendo que a otimização se limita à adição de reciclos.

    Para ele, faltam, sobretudo, questionamentos a respeito de pontos fundamentais como custo, segurança e robustez, fatores que, na prática industrial, são fundamentais no design de qualquer processo.

    Como o Professor Moran é estrangeiro, fica evidente que os problemas levantados fazem parte de qualquer escola de Engenharia Química, não sendo exclusivos das universidades brasileiras. E você, concorda com Seán Moran? Vale a pena uma reflexão sobre estes pontos durante nossa formação.

    Você pode acessar os artigos originais através dos links a seguir:

    Truth and Empiricism, por Seán Moran.

    Leia também:

    Educational Shortcomings in Chemical Engineering, por Seán Moran.

Por Lucas Molenda Jambersi, membro da Escola Piloto de Engenharia Química da UFPR.